Opinião

Passo importante para a reforma de São Januário

Autores

  • Thiago de Freitas Benevenuto
    é mestre em Direito pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) advogado da União e eleito para o Conselho Deliberativo do Club de Regatas Vasco da Gama para o triênio de 2024 a 2026.
  • Fabio Nogueira
    é economista (Uerj) com pós-graduação em engenharia econômica pela Uerj e Marketing pela ESPM e eleito para o Conselho Deliberativo do Club de Regatas Vasco da Gama para o triênio de 2024 a 2026.
18 de novembro de 2023, 15h20
Editorias: 
O último fim de semana foi de intensas emoções para os vascaínos, dentro e fora do campo. Domingo passado, o time obteve uma vitória sofrida sobre o América-MG com o gol que decidiu a partida nos acréscimos do segundo tempo e ganhou ainda mais tração na luta contra a degola no Campeonato Brasileiro. Nas eleições do sábado passado, com grande maioria de votos, foi eleito presidente da diretoria administrativa do Club de Regatas Vasco da Gama o ex-jogador e ídolo Pedrinho, o qual tem todas as credenciais necessárias para realizar uma excelente gestão.

No entanto, aqui, queremos chamar atenção para um outro fato acontecido fora de campo na sexta-feira do último dia 10 de novembro. Trata-se do envio, pela Prefeitura do Rio de Janeiro para a Câmara Municipal, do Projeto de Lei Complementar nº 142/2023 [1], que institui a Operação Urbana Consorciada (OUC) do Estádio de São Januário, cria mecanismos para permitir a revitalização do complexo esportivo, estabelece contrapartidas para a melhoria da região onde se localiza o estádio, entre outras obrigações.

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A reforma de São Januário, certamente, será um dos grandes, se não o maior, desafio para o novo presidente do clube e sua equipe, sendo de importância transcendental para o futuro do Vasco dentro do contexto da criação de uma Sociedade Anônima do Futebol para gerir o futebol. Com efeito, é fato público e notório que umas das principais fontes de arrecadação do clube é o aluguel do estádio de São Januário para a SAF. Por isso, quanto maior for o potencial de arrecadação, mais vantajoso poderá ser o valor do aluguel a cargo da SAF.

Na justificativa do projeto, o prefeito Eduardo Paes destaca a importância histórica, social e econômica do estádio, inaugurado em 1927. O texto faz referência a dados colhidos pelo Observatório do Trabalho Carioca, segundo os quais, durante a sua interdição entre julho e setembro deste ano, “comerciantes que trabalham em atividades vinculadas à realização de partidas de futebol no estádio de São Januário relataram uma perda de quase 60% de sua receita mensal, o que aponta para a importância do ecossistema desenvolvido pelo Estádio, Clube e seus torcedores no bairro de São Cristóvão. Ainda segundo a instituição, em dias de jogos, vendedores autônomos chegam a gerar até R$ 8.000 de receita”.

A OUC Estádio de São Januário, no bairro Vasco da Gama, compreenderá um conjunto de intervenções coordenadas pelo Poder Executivo Municipal, com a participação do clube representantes de seu quadro de associados, como usuários permanentes, moradores do entorno e investidores privados, visando à valorização, manutenção e melhoramentos do Estádio de São Januário e seu entorno. Terá prazo de 120 meses (artigos 1º; e 3º, §1º). Serão estabelecidos mecanismos para a obtenção de arrecadação de investimentos financeiros provenientes da iniciativa privada, através da Transferência do Direito de Construir e pela Permissão de Construção Elevada sobre o Embasamento da Sede Náutica da Lagoa, possibilitando ao Club de Regatas Vasco da Gama direcionar os recursos provenientes da OUC para a execução de seus objetivos (artigo 1º, §2º). Com efeito, de acordo com o projeto, um total de 197 mil metros quadrados de potencial construtivo não utilizado no complexo de São Januário poderá ser transferido para diversas regiões da cidade (artigo 8º, caput). A área corresponde ao espaço que poderia ser ocupado por construções no terreno do estádio de acordo com a legislação, mas que não será utilizado e poderá ser negociado pelo clube para financiar a reforma. Além disso, o Projeto de Lei Complementar nº 142/2023 permite a construção adicional de edificação destinada a unidades residenciais sobre o embasamento existente na Sede Náutica da Lagoa, excetuando-se os pavimentos destinados à guarda e estacionamento de veículos e de uso comum. As atuais áreas do embasamento existente, componentes do salão de festas e eventos, situadas no primeiro pavimento e o seu respectivo mezanino, no entanto, deverão ser mantidas e preservadas, ressalvadas as necessárias intervenções de conservação e modernização, sendo permitida a transformação de uso e modificações arquitetônicas interiores das construções das áreas não sociais (artigo 11, caput, X e XI). A transferência do potencial construtivo será concedida mediante 1) a apresentação do Plano da OUC referente à execução das obras de proteção, manutenção, renovação, expansão do Complexo do Estádio de São Januário; 2) apresentação e aprovação do projeto legal arquitetônico para o Estádio de São Januário; 3) apresentação de estudo de melhoria de fluxo e impacto viário, estacionamentos e fluxo e acessibilidade para os pedestres, no entorno do Estádio de São Januário; 4) apresentação de plano de alcance social para as comunidades vizinhas ao Estádio de São Januário e associados da agremiação; 5) apresentação do projeto de valorização da memória cultural e histórica, do centro de referência, museu físico e virtual, bem como sala de exibições de troféus a ser implantado no estádio de São Januário; 6) revitalização do espaço urbano do entorno à OUC Estádio de São Januário, contemplando recuperação de passeios, arborização, iluminação pública do quarteirão, segurança para a circulação do pedestre, restauração da fachada tombada e das demais fachadas do Complexo; (vii) apresentação de planos e projetos culturais a serem implantados como atividades para o Estádio de São Januário, com alcance para a Cidade; e 7) apresentação e aprovação do projeto legal arquitetônico para a construção adicional de edificação destinada a unidades residenciais multifamiliares sobre o embasamento da Sede Náutica da Lagoa (artigo 14). Para a regular e plena alienação do potencial construtivo de São Januário, o clube deverá constituir Sociedade de Propósito Específico (SPE), sob a forma de sociedade anônima, que deverá ter como único objeto social, que não poderá ser alterado, a execução da revitalização do estádio. O tempo de duração da SPE deverá ser, pelo menos, igual ao prazo da revitalização do estádio, acrescido do tempo necessário para a liquidação e extinção de todas as suas obrigações. A SPE deverá obedecer a padrões de governança corporativa, devendo publicar demonstrações contábeis padronizadas e auditadas anualmente, de acordo com as práticas contábeis adotadas no Brasil, por auditoria externa e independente (artigo 21 e seguintes). A SPE deverá submeter o Projeto Básico à apreciação do Poder Executivo Municipal, no prazo de até 90 dias contados da publicação da Lei Complementar, e o Projeto Executivo e a Estrutura Analítica do Projeto (EAP) no prazo de até 90 dias contados da aprovação do Projeto Básico. Referidos documentos serão aprovados no âmbito do município no prazo de até 20 dias corridos, contados da data do seu recebimento (artigos 29, 30 e 31). A SPE arcará com todos os investimentos relativos às obras, obrigando-se a fazê-las por sua conta e risco, em conformidade com as especificações definidas no Projeto Básico, no Projeto Executivo e na Estrutura Analítica de Projeto aprovados pelo Poder Executivo Municipal (artigo 33). Além disso, é prevista a contratação de um seguro de garantia de execução cujo objeto será a revitalização do estádio de São Januário, tendo por segurado o município do Rio de Janeiro em montante igual a 5% do valor informado no orçamento detalhado a que se refere a lei (artigo 38, caput e §2º). É de extrema importância observar que o projeto de lei estabelece que os recursos obtidos com a cessão do potencial construtivo de São Januário e com a venda das unidades residenciais a serem construídas na Sede Náutica da Lagoa serão aplicados exclusivamente nas operações para a revitalização do estádio. Tais recursos não poderão ser utilizados para pagamento de dívidas de quaisquer naturezas contraídas pelo clube ou pela SAF, para pagamentos referentes aos salários, premiações, compra de direitos de passe e/ou de empréstimos para atletas e/ou funcionários, diretos ou terceirizados, pagamentos de compromissos assumidos antes e depois da lei, bem como investimentos a serem realizados fora dos limites do complexo do estádio de São Januário e seu entorno (artigos 1º, §§4º, 5º e 6º; e 11, §§1º a 4º). Logo, entende-se que, da forma como está o projeto atualmente, em caso de sua aprovação, o clube não poderá destinar recursos para realização de obras em outras sedes, como, por exemplo, a do Calabouço. O texto estabelece diversas contrapartidas pela OUC São Januário mediante intervenções a serem implementadas no Estádio e seu entorno (artigo 13, I a XVIII), além de atribuir o acompanhamento de sua implementação a um conselho consultivo composto por entidades organizadas com representatividade na área de abrangência da OUC São Januário (artigo 17); e a fiscalização da compatibilidade entre a execução das obras da revitalização do estádio de São Januário e os Projetos Básico e Executivo aprovados pelo Poder Executivo Municipal, bem o avanço físico-financeiro das obras baseado na Estrutura Analítica do Projeto (EAP) à Companhia Carioca de Parcerias e Investimentos (CCPar), sendo-lhe asseguradas todas as prerrogativas previstas na legislação aplicável, bem como a possibilidade de realizar Auditoria e Verificação (artigos 27 e 32). Destaca-se, ainda, a criação de um Programa de Atendimento Social e Urbanístico, com diretrizes como a preferência de contratação de trabalhadores residentes na vizinhança e comunidades do bairro, bem como aos associados do clube; a melhoria do entorno; incremento do programa de escola existente no atual Complexo de São Januário, ampliando seus espaços, associando atividades esportivas com educacionais; incentivo a atividades extra esportivas na região; alcance de transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais, segurança do patrimônio e aos usuários, preservação e valorização histórica e cultural do bem, do bairro e sua vizinhança, com alcance para toda a cidade do Rio de Janeiro. A leitura atenta do Projeto de Lei Complementar nº 142/2023 permite concluir que os desafios para a concretização da reforma de São Januário não podem ser menosprezados. Com efeito, as contrapartidas previstas na proposta apresentam uma complexidade razoável, assim como os projetos, planos e estudos necessários para a transferência do potencial construtivo. É certo que, por se tratar de um Projeto de Lei, ajustes poderão ser feitos no sentido do seu aprimoramento na Câmara Municipal, o que poderá ser trabalhado pela gestão atual do clube e, eventualmente pela futura, caso não seja aprovado até a sua posse. O fato é que, nesse último final de semana de acontecimentos relevantes para os vascaínos, foi dado um passo importante para a reforma de São Januário, o que será fundamental para o futuro e própria sobrevivência do Vasco da Gama.

[1] Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2023.

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    é mestre em Direito pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), advogado da União e eleito para o Conselho Deliberativo do Club de Regatas Vasco da Gama para o triênio de 2024 a 2026.
  • Fabio Nogueira
    é economista (Uerj), com pós-graduação em engenharia econômica pela Uerj e Marketing pela ESPM e eleito para o Conselho Deliberativo do Club de Regatas Vasco da Gama para o triênio de 2024 a 2026.

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